ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

19 de janeiro de 2023 (* (i) 

«Reenvio prejudicial — Aproximação das legislações — Produtos biocidas — Regulamento (UE) n.o 528/2012 — Artigo 72.o — Livre circulação de mercadorias — Artigo 34.o TFUE — Possibilidade de os Estados‑Membros adotarem medidas restritivas em matéria de práticas comerciais e de publicidade — Modalidades de venda não abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 34.o TFUE — Justificação — Artigo 36.o TFUE — Objetivo de preservação da saúde humana e animal e do ambiente — Proporcionalidade»

No processo C‑147/21,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, França), por Decisão de 5 de março de 2021, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 8 de março de 2021, no processo

Comité interprofessionnel des huiles essentielles françaises (CIHEF),

Florame,

Hyteck Aroma‑Zone,

Laboratoires Gilbert,

Laboratoire Léa Nature,

Laboratoires Oméga Pharma France,

Pierre Fabre Médicament,

Pranarom France,

Puressentiel France

contra

Ministre de la Transition écologique,

Premier ministre,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: K. Jürimäe, presidente de secção, M. Safjan, N. Piçarra, N. Jääskinen e M. Gavalec (relator), juízes,

advogado‑geral: N. Emiliou,

secretária: M. Ferreira, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 9 de março de 2022,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação do Comité interprofessionnel des huiles essentielles françaises (CIHEF), da Florame, da Hyteck Aroma‑Zone, da Laboratoires Gilbert, da Laboratoire Léa Nature, da Laboratoires Oméga Pharma France, da Pierre Fabre Médicament, da Pranarom France e da Puressentiel France, por A. Bost, V. Lehmann e M. Ragot, avocats,

–        em representação do Governo francês, por G. Bain e T. Stéhelin, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por G. Palatiello, avvocato dello Stato,

–        em representação do Governo neerlandês, por K. Bulterman e A. M. de Ree, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por R. Lindenthal e F. Thiran, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 2 de junho de 2022,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação de disposições do Regulamento (UE) n.o 528/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2012, relativo à disponibilização no mercado e à utilização de produtos biocidas (JO 2012, L 167, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (UE) n.o 334/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março de 2014 (JO 2014, L 103, p. 22) (a seguir «Regulamento n.o 528/2012»).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe o Comité interprofessionnel des huiles essentielles françaises (CIHEF) e oito sociedades que operam no setor dos óleos essenciais à ministre de la Transition écologique (ministra da Transição Ecológica, França) e ao Premier ministre (primeiro‑ministro, França) a respeito de recursos que tinham por objeto a anulação, por um lado, do décret no 2019‑642, du 26 juin 2019, relatif aux pratiques commerciales prohibées pour certaines catégories de produits biocides (Decreto n.o 2019‑642, de 26 de junho de 2019, relativo às práticas comerciais proibidas para certas categorias de produtos biocidas) (JORF de 27 de junho de 2019, p. 10), e, por outro, do décret no 2019‑643, du 26 juin 2019, relatif à la publicité commerciale pour certaines catégories de produits biocides (Decreto n.o 2019‑643, de 26 de junho de 2019, relativo à publicidade comercial para certas categorias de produtos biocidas) (JORF de 27 de junho de 2019, p. 11).

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        Os considerandos 1 a 3, 6, 28 e 31 do Regulamento n.o 528/2012 enunciam:

«(1)      Os produtos biocidas são necessários para controlar os organismos prejudiciais à saúde humana ou animal e os organismos que provocam danos em materiais naturais ou manufaturados. Contudo, os produtos biocidas podem pôr em risco os seres humanos, os animais e o ambiente devido às suas propriedades intrínsecas e aos padrões de utilização que lhes estão associados.

(2)      Os produtos biocidas não deverão poder ser disponibilizados no mercado nem utilizados se não tiverem sido autorizados nos termos do presente regulamento. Os artigos tratados não deverão poder ser colocados no mercado a não ser que todas as substâncias ativas incorporadas nos produtos biocidas com os quais foram tratados sejam aprovadas nos termos do presente regulamento.

(3)      O presente regulamento visa melhorar a livre circulação de produtos biocidas na União, assegurando simultaneamente um elevado nível de proteção da saúde humana e animal e do ambiente. Deverá prestar‑se especial atenção à proteção de grupos vulneráveis, tais como as grávidas e as crianças. O presente regulamento deverá basear‑se no princípio da precaução, a fim de garantir que o fabrico e a disponibilização no mercado de substâncias ativas e de produtos biocidas não tenham efeitos nocivos na saúde humana ou animal nem efeitos inaceitáveis no ambiente. A fim de eliminar, tanto quanto possível, os entraves ao comércio de produtos biocidas, deverão ser estabelecidas regras para a aprovação de substâncias ativas e para a disponibilização no mercado e a utilização de produtos biocidas, inclusive regras em matéria de reconhecimento mútuo das autorizações e de comércio paralelo.

[…]

(6)      Tendo em conta as principais alterações que deverão ser introduzidas nas regras em vigor, um regulamento constitui o instrumento jurídico adequado para substituir a Diretiva 98/8/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de fevereiro de 1998, relativa à colocação de produtos biocidas no mercado (JO 1998, L 123, p. 1)] a fim de fixar regras claras, pormenorizadas e diretamente aplicáveis. Além disso, com um regulamento assegura‑se que os requisitos jurídicos sejam aplicados em simultâneo e de modo harmonizado em toda a União.

[…]

(28)      Para assegurar que apenas sejam disponibilizados no mercado produtos biocidas conformes com as disposições aplicáveis do presente regulamento, os produtos biocidas deverão ser sujeitos a autorização pelas autoridades competentes, em caso de disponibilização no mercado e utilização no território de um Estado‑Membro ou em parte do mesmo, ou pela Comissão, em caso de disponibilização no mercado e utilização na União.

[…]

(31)      É necessário estabelecer princípios comuns para a avaliação e a autorização de produtos biocidas a fim de garantir uma abordagem harmonizada por parte das autoridades competentes.»

4        O artigo 1.o deste regulamento, sob a epígrafe «Finalidade e objeto», prevê:

«1.      O presente regulamento visa melhorar o funcionamento do mercado interno através da harmonização das normas relativas à disponibilização no mercado e à utilização de produtos biocidas, assegurando simultaneamente um elevado nível de proteção da saúde humana e animal e do ambiente. As disposições do presente regulamento assentam no princípio da precaução, com o qual se pretende preservar a saúde dos seres humanos, a saúde dos animais e o ambiente. Deve ser conferida atenção particular à proteção dos grupos vulneráveis.

2.      O presente regulamento estabelece regras para:

a)      A criação, ao nível da União, de uma lista das substâncias ativas que podem ser utilizadas em produtos biocidas;

b)      A autorização de produtos biocidas;

c)      O reconhecimento mútuo das autorizações na União;

d)      A disponibilização no mercado e a utilização de produtos biocidas num ou em vários Estados‑Membros ou na União;

e)      A colocação no mercado de artigos tratados.»

5        O artigo 2.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», dispõe:

«1.      O presente regulamento é aplicável aos produtos biocidas e aos artigos tratados. O Anexo V contém uma lista dos tipos de produtos biocidas abrangidos pelo presente regulamento e as respetivas descrições.

[…]

3.      Salvo disposição expressa em contrário no presente regulamento ou noutra legislação da União, o presente regulamento em nada prejudica o disposto nos seguintes diplomas:

[…]

k)      Diretiva 2006/114/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa à publicidade enganosa e comparativa [JO 2006, L 376, p. 21];

[…]

m)      Regulamento (CE) n.o 1272/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativo à classificação, rotulagem e embalagem de substâncias e misturas[, que altera e revoga as Diretivas 67/548/CEE e 1999/45/CE, e altera o Regulamento (CE) n.o 1907/2006 (JO 2008, L 353, p. 1)];

[…]»

6        Nos termos do artigo 3.o do mesmo regulamento, sob a epígrafe «Definições»:

«1.      Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

[…]

i)      “Disponibilização no mercado” qualquer fornecimento, no âmbito de uma atividade comercial, de um produto biocida, ou de um artigo tratado, para distribuição ou utilização, a título oneroso ou gratuito;

j)      “Colocação no mercado” a primeira disponibilização no mercado de um produto biocida ou de um artigo tratado;

k)      “Utilização” todas as operações efetuadas com um produto biocida, incluindo a armazenagem, o manuseamento, a mistura e a aplicação, com exceção das operações realizadas com vista à exportação do produto biocida ou do artigo tratado para fora da União;

[…]

y)      “Publicidade” qualquer meio de promover a venda ou utilização de produtos biocidas por meios impressos, eletrónicos ou outros;

[…]»

7        No capítulo IV do Regulamento n.o 528/2012, intitulado «Princípios gerais relativos à autorização de produtos biocidas», figura o artigo 17.o do mesmo, sob a epígrafe «Disponibilização no mercado e utilização de produtos biocidas», que tem a seguinte redação:

«1.      Só podem ser disponibilizados no mercado, ou utilizados, os produtos biocidas que tenham sido autorizados nos termos do presente regulamento.

[…]

5.      Os produtos biocidas devem ser utilizados de acordo com os termos e condições da autorização estipulados nos termos do artigo 22.o, n.o 1, e dos requisitos de rotulagem e embalagem fixados no artigo 69.o.

Uma utilização correta implica a aplicação racional de um conjunto de medidas físicas, biológicas, químicas ou outras, consoante adequado, que permitam limitar ao mínimo necessário a utilização de produtos biocidas e as medidas de precaução adequadas.

Os Estados‑Membros tomam as medidas necessárias para facultar ao público informações adequadas sobre os benefícios e riscos associados aos produtos biocidas, bem como sobre os modos de minimizar a sua utilização.

[…]»

8        O artigo 18.o deste regulamento, sob a epígrafe «Medidas que visam a utilização sustentável dos produtos biocidas», prevê:

«Até 18 de julho de 2015, a Comissão apresenta ao Parlamento Europeu e ao Conselho, com base na experiência adquirida com a aplicação do presente regulamento, um relatório sobre a forma como este contribui para a utilização sustentável dos produtos biocidas, incluindo a necessidade de adotar medidas adicionais, em particular para os utilizadores profissionais, com o objetivo de reduzir os riscos dos produtos biocidas para a saúde humana, para a saúde animal e para o ambiente. Este relatório deve examinar, nomeadamente:

a)      A promoção de boas práticas como meio de reduzir ao mínimo a utilização de produtos biocidas;

b)      As abordagens mais eficazes para controlar a utilização de produtos biocidas;

c)      O desenvolvimento e a aplicação de princípios para uma gestão integrada de pragas no que se refere à utilização de produtos biocidas;

d)      Os riscos decorrentes da utilização de produtos biocidas em zonas específicas, tais como escolas, locais de trabalho, infantários, espaços públicos, centros de geriatria ou na proximidade de águas subterrâneas ou superficiais, e a eventual necessidade de medidas adicionais para pôr termo a esses riscos;

e)      O papel que um melhor desempenho do equipamento usado na aplicação de produtos biocidas pode ter na utilização sustentável destes produtos.

Com base nesse relatório, a Comissão apresenta, se for caso disso, uma proposta legislativa a adotar nos termos do processo legislativo ordinário.»

9        Nos termos do artigo 19.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Condições de concessão da autorização»:

«1.      Os produtos biocidas que não sejam elegíveis para o processo de autorização simplificado, nos termos do artigo 25.o, só podem ser autorizados se estiverem preenchidas as seguintes condições:

a)      As substâncias ativas estão incluídas no anexo I ou foram aprovadas para o tipo de produto em causa e estão preenchidas todas as condições especificadas para estas substâncias ativas;

b)      Foi estabelecido, de acordo com os princípios comuns de avaliação de dossiers de produtos biocidas definidos no Anexo VI, que o produto biocida, quando utilizado de acordo com a autorização e tendo em conta os fatores referidos no n.o 2 do presente artigo, satisfaz os seguintes critérios:

i)      o produto biocida é suficientemente eficaz,

ii)      o produto biocida não tem efeitos inaceitáveis nos organismos visados, em particular fenómenos de resistência ou resistência cruzada inaceitáveis, ou dor e sofrimento desnecessários nos vertebrados,

iii)      o produto biocida não tem, por si só nem em consequência dos seus resíduos, efeitos inaceitáveis, imediatos ou a prazo, na saúde dos seres humanos, incluindo a saúde dos grupos vulneráveis, nem na saúde dos animais, diretamente ou através da água potável, dos géneros alimentícios, dos alimentos para animais ou do ar, ou através de quaisquer outros efeitos indiretos,

iv)      o produto biocida não tem, por si mesmo nem em consequência dos seus resíduos, efeitos inaceitáveis no ambiente […]»

10      O artigo 20.o do mesmo regulamento, sob a epígrafe «Requisitos dos pedidos de autorização», dispõe, no seu n.o 1:

«O requerente da autorização deve fazer acompanhar o pedido com os seguintes documentos:

a)      Para os produtos biocidas que não preencham as condições estabelecidas no artigo 25.o:

i)      um dossier ou carta de acesso referente ao produto biocida, no cumprimento dos requisitos estabelecidos no Anexo III,

ii)      um resumo das características do produto biocida, que inclua as informações referidas no artigo 22.o, n.o 2, alíneas a), b) e e) a q), se aplicável,

iii)      um dossier ou uma carta de acesso referente ao produto biocida no cumprimento dos requisitos previstos no Anexo II relativamente a cada uma das substâncias ativas do produto biocida;

b)      Para os produtos biocidas que o requerente considere preencherem as condições estabelecidas no artigo 25.o:

i)      um resumo das características do produto biocida referida no presente número, alínea a), subalínea ii),

ii)      dados relativos à eficácia, e

iii)      outras informações pertinentes que corroborem a conclusão de que o produto biocida preenche as condições fixadas no artigo 25.o»

11      O capítulo V do Regulamento n.o 528/2012, intitulado «Procedimento de autorização simplificado», abrange os artigos 25.o a 28.o do mesmo, que preveem o procedimento de autorização aplicável aos produtos biocidas que reúnam determinadas condições.

12      No capítulo XIII deste regulamento, intitulado «Artigos Tratados», figura o artigo 58.o do mesmo, sob a epígrafe «Colocação no mercado de artigos tratados», que dispõe, no seu n.o 2:

«Os artigos tratados só podem ser colocados no mercado se todas as substâncias ativas contidas nos produtos biocidas com que foram tratados ou que neles foram incorporados estiverem incluídas na lista elaborada ao abrigo do artigo 9.o, n.o 2, para o tipo de produto e utilização pertinentes, ou no Anexo I, e se se encontrarem preenchidas todas as condições ou restrições aí especificadas.»

13      O capítulo XV do referido regulamento, intitulado «Informação e comunicação», contém uma secção 2, por sua vez intitulada «Informações sobre produtos biocidas», que abrange os artigos 69.o a 73.o do mesmo regulamento. O artigo 69.o, sob a epígrafe «Classificação, embalagem e rotulagem de produtos biocidas», prevê:

«1.      Os titulares de autorizações asseguram que os produtos biocidas são classificados, embalados e rotulados nos termos do resumo aprovado das características do produto biocida, em especial das advertências de perigo e recomendações de prudência, conforme referido no artigo 22.o, n.o 2, alínea i), e da Diretiva 1999/45/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de maio de 1999, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros respeitantes à classificação, embalagem e rotulagem das preparações perigosas (JO 1999, L 200, p. 1)] e, quando aplicável, do Regulamento [n.o 1272/2008].

Além disso, os produtos suscetíveis de serem confundidos com géneros alimentícios, inclusive bebidas, ou alimentos para animais, devem ser embalados de modo a reduzir ao mínimo a probabilidade de ocorrência de tal confusão. Se estiverem ao dispor do público, devem conter componentes que desencorajem o seu consumo e, em particular, não devem ser atrativos para as crianças.

2.      Para além do cumprimento do disposto no n.o 1, os titulares de autorizações asseguram que os rótulos não sejam enganosos quanto aos riscos do produto para a saúde humana, para a saúde animal ou para o ambiente ou quanto à sua eficácia e garantem, em qualquer caso, que não contenham as menções “produto biocida de baixo risco”, “não tóxico”, “inócuo”, “natural”, “respeitador do ambiente”, “respeitador dos animais” nem indicações semelhantes. Além disso, o rótulo deve conter, de forma clara e indelével, as seguintes informações:

[…]

f)      Utilizações autorizadas do produto biocida;

g)      Instruções de utilização, frequência de aplicação e dosagem, expressa em unidades métricas de modo a ter sentido e ser compreensível para os utilizadores, relativamente a cada uma das utilizações previstas nos termos da autorização;

[…]

i)      Menção “Ler as instruções apensas antes de utilizar”, caso o produto seja acompanhado de um folheto informativo e, se for caso disso, advertências destinadas aos grupos vulneráveis;

[…]

m)      Quando aplicável, categorias de utilizadores aos quais está limitada a utilização do produto biocida;

n)      Quando aplicável, informações relativas a qualquer perigo específico para o ambiente, nomeadamente no que respeita à proteção dos organismos não visados e à prevenção da contaminação das águas;

[…]

3.      Os Estados‑Membros podem exigir que:

a)      Sejam apresentados modelos ou projetos das embalagens, dos rótulos e dos folhetos;

b)      Os produtos biocidas disponibilizados no mercado nos seus territórios sejam rotulados na sua língua ou línguas oficiais.»

14      O capítulo XV do Regulamento n.o 528/2012 abrange igualmente o artigo 72.o, sob a epígrafe «Publicidade», que tem a seguinte redação:

«1.      A publicidade aos produtos biocidas, além de respeitar o Regulamento [n.o 1272/2008], deve incluir as menções “Utilize os biocidas com cuidado. Leia sempre o rótulo e a informação relativa ao produto antes de o utilizar.”. As menções devem ser legíveis e distinguir‑se claramente do conteúdo geral do anúncio.

2.      Os anunciantes podem substituir o termo “biocidas” nas menções exigidas por uma referência clara ao tipo de produto anunciado.

3.      A publicidade aos produtos biocidas não deve referir‑se ao produto de uma forma enganosa no que diz respeito aos riscos do produto para a saúde humana, para a saúde animal ou para o ambiente, ou à sua eficácia. A publicidade a um produto biocida não pode, em caso algum, conter as menções “produto biocida de baixo risco”, “não tóxico”, “inócuo”, “natural”, “respeitador do ambiente”, “respeitador dos animais”, nem indicações semelhantes.»

15      O anexo V deste regulamento, intitulado «Tipos de Produtos Biocidas e a sua descrição na aceção do artigo 2.o, n.o 1», dispõe:

«Grupo 1: Desinfetantes

[…]

Tipo de produtos 2: Desinfetantes e algicidas não destinados a aplicação direta em seres humanos ou animais

[…]

Tipo de produtos 4: Superfícies em contacto com os géneros alimentícios e alimentos para animais

[…]

Grupo 3: Produtos de controlo de animais prejudiciais

Tipo de produtos 14: Rodenticidas

[…]

Tipo de produtos 18: Inseticidas, acaricidas e produtos destinados a controlar outros artrópodes

[…]»

 Direito francês

16      O artigo L. 522‑5‑3 do code de l’environnement (a seguir «Código do Ambiente») dispõe:

«É proibida qualquer publicidade comercial para certas categorias de produtos biocidas definidas pelo Regulamento [n.o 528/2012].

Em derrogação do primeiro parágrafo do presente artigo, é autorizada a publicidade dirigida aos utilizadores profissionais nos pontos de distribuição dos produtos a estes utilizadores e nas publicações dirigidas aos mesmos.

Serão definidas por decreto do Conseil d’État [Conselho de Estado] as categorias de produtos em causa em função dos riscos para a saúde humana e para o ambiente, bem como as condições em que os anúncios publicitários são apresentados. Estes anúncios publicitários devem destacar as boas práticas na utilização e na aplicação dos produtos para a proteção da saúde humana e animal e para o ambiente, assim como os potenciais riscos para a saúde humana e animal e para o ambiente.»

17      O artigo L. 522‑18 deste código prevê:

«No âmbito da venda de produtos biocidas definidos no artigo L. 522‑1, são proibidos os descontos, os abatimentos, as reduções, a diferenciação das condições gerais e especiais de venda na aceção do artigo L. 441‑1 do code de commerce [Código Comercial] ou a entrega de unidades gratuitas e todas as práticas equivalentes. Qualquer prática comercial que vise contornar, direta ou indiretamente, esta proibição, mediante a concessão de descontos, abatimentos ou reduções noutra gama de produtos que esteja relacionada com a aquisição dos referidos produtos é proibida.

Serão especificadas por decreto do Conseil d’État [Conselho de Estado] as categorias de produtos em causa em função dos riscos para a saúde humana e para o ambiente.»

18      O artigo R. 522‑16‑1 do referido código, introduzido pelo Decreto n.o 2019‑642, de 26 de junho de 2019, adotado em aplicação do artigo L. 522‑18 do Código do Ambiente, dispõe:

«As categorias de produtos mencionadas no artigo L. 522‑18, relativamente às quais são proibidas certas práticas comerciais, são os produtos abrangidos pelos tipos 14 e 18 definidos pelo Regulamento [n.o 528/2012].

Estas disposições não se aplicam aos produtos biocidas admissíveis ao procedimento de autorização simplificado em conformidade com o artigo 25.o do mesmo regulamento.»

19      Nos termos do artigo R. 522‑16‑2 do mesmo código, introduzido pelo Decreto n.o 2019‑643, de 26 de junho de 2019, adotado em aplicação do artigo L. 522‑5‑3 do Código do Ambiente:

«I.‑ As categorias de produtos biocidas referidas no artigo L. 522‑5‑3, cuja publicidade comercial dirigida ao público em geral é proibida, são as seguintes:

1.o Os produtos abrangidos pelos tipos 14 e 18 definidos pelo Regulamento [n.o 528/2012];

2.o Os produtos abrangidos pelos tipos 2 e 4 definidos por este mesmo regulamento e classificados, segundo as disposições do [Regulamento n.o 1272/2008], como perigosos para o ambiente aquático de categoria 1: toxicidade aguda de categoria 1 (H 400) e toxicidade crónica de categoria 1 (H 410).

II.‑ Quanto aos produtos referidos no ponto I, a publicidade dirigida a profissionais deve respeitar o disposto no artigo 72.o do Regulamento [n.o 528/2012] referido no n.o 1 do ponto I. Além disso, tem de incluir, de maneira clara e legível, os seguintes elementos:

1.o Duas frases com a seguinte redação: “Antes de qualquer utilização, certifique‑se de que esta é indispensável, especialmente em locais frequentados pelo público em geral. Sempre que possível, opte por métodos alternativos e produtos com menor risco para a saúde humana e animal e para o ambiente”.

2.o A indicação do tipo de produtos biocidas associados ao produto, conforme definido no anexo V do Regulamento [n.o 528/2012], anteriormente referido.

III.‑ As disposições do presente artigo não são aplicáveis aos produtos biocidas elegíveis para o procedimento de autorização simplificado em conformidade com o artigo 25.o do [Regulamento n.o 528/2012].»

 Litígio no processo principal e questão prejudicial

20      Por meio de duas petições, as recorrentes no processo principal interpuseram no Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, França) recursos de anulação por excesso de poder, por um lado, do Decreto n.o 2019‑642, de 26 de junho de 2019, e, por outro, do Decreto n.o 2019‑643, de 26 de junho de 2019. Resulta da decisão de reenvio que estes decretos introduziram as disposições que figuram nos artigos R. 522‑16‑1 e R. 522‑16‑2 do Código do Ambiente que constituem as disposições regulamentares de aplicação dos artigos L. 522‑18 e L. 522‑5‑3.

21      As recorrentes no processo principal alegaram, nomeadamente, que estes decretos não têm base jurídica, uma vez que foram adotados em violação do Regulamento n.o 528/2012.

22      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, este regulamento não contém nenhuma disposição que autorize ou proíba os Estados‑Membros a preverem medidas restritivas como as que constam dos artigos L. 522‑18 e L. 522‑5‑3 do Código do Ambiente. Consequentemente, levanta‑se a questão de saber se tais medidas, não previstas pelo referido regulamento, podem ser adotadas sem violar este último. A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio sublinha que as disposições legislativas, em aplicação das quais foram adotados os decretos mencionados no n.o 20 do presente acórdão, têm como objetivo prevenir as implicações negativas que a utilização excessiva de determinados produtos biocidas apresenta para a saúde pública e para o ambiente. É certo que este objetivo não contraria os prosseguidos pelo Regulamento n.o 528/2012. Todavia, as proibições previstas nestas disposições legislativas intervêm no âmbito da colocação no mercado de produtos biocidas, cuja harmonização ao nível da União é objeto do referido regulamento, sem que o mesmo remeta para a adoção de diplomas de aplicação pelos Estados‑Membros e sem que tais diplomas sejam necessários para assegurar a plena eficácia desse regulamento.

23      Nestas condições, o Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O Regulamento [n.o 528/2012] opõe‑se a que um Estado‑Membro adote, no interesse da saúde pública e do ambiente, regras restritivas em matéria de práticas comerciais e de publicidade como as previstas nos artigos L. 522‑18 e L. 522‑5‑3 do Código do Ambiente? Se assim for, em que condições pode um Estado‑Membro adotar tais medidas?»

 Quanto à questão prejudicial

24      A título preliminar, importa recordar que, no âmbito do processo de cooperação entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça, instituído pelo artigo 267.o TFUE, cabe a este dar ao juiz nacional uma resposta útil que lhe permita decidir o litígio que lhe foi submetido. Nesta ótica, incumbe ao Tribunal, sendo caso disso, não só reformular a questão que lhe é submetida mas também ter em consideração normas do direito da União às quais o juiz nacional não tenha feito referência no enunciado da sua questão (Acórdão de 16 de maio de 2019, Plessers, C‑509/17, EU:C:2019:424, n.o 32 e jurisprudência referida).

25      No caso em apreço, o Tribunal de Justiça é questionado, em termos gerais, sobre a interpretação do Regulamento n.o 528/2012, a fim de determinar, em substância, se a regulamentação em causa no processo principal diz respeito a um domínio harmonizado pelas disposições deste regulamento e, sendo caso disso, se o referido regulamento se opõe a tal regulamentação.

26      A este propósito, há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, qualquer medida nacional, num domínio que foi objeto de uma harmonização exaustiva ao nível da União, deve ser apreciada à luz das disposições dessa medida de harmonização e não das disposições do direito primário (Acórdão de 24 de fevereiro de 2022, Viva Telecom Bulgaria, C‑257/20, EU:C:2022:125, n.o 45 e jurisprudência referida).

27      Assim, há que entender a questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio no sentido de que tem por objeto, em primeiro lugar, a interpretação do referido regulamento e, em segundo lugar, caso esse regulamento não tenha procedido a uma harmonização exaustiva, a interpretação das disposições do Tratado FUE relativas à livre circulação de mercadorias, isto é, os artigos 34.o e 36.o TFUE.

28      Por conseguinte, para dar uma resposta útil ao órgão jurisdicional de reenvio para efeitos da resolução do litígio que lhe foi submetido, há que entender que, com a sua questão, este último pergunta, em substância, se o Regulamento n.o 528/2012 e, se for caso disso, os artigos 34.o e 36.o TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional:

–        que proíbe certas práticas comerciais, como os descontos, os abatimentos, as reduções, a diferenciação das condições gerais e especiais de venda, a entrega de unidades gratuitas e todas as práticas equivalentes, relativas a produtos biocidas dos tipos de produtos 14 e 18, abrangidos pelo grupo 3 destes tipos de produtos, que figuram no anexo V deste regulamento (a seguir «produtos biocidas dos tipos de produtos 14 e 18»);

–        que exige a aposição de uma menção na publicidade dirigida aos profissionais de produtos biocidas dos tipos de produtos 2 e 4, abrangidos pelo grupo 1 destes tipos de produtos, que figuram no anexo V do Regulamento n.o 528/2012 (a seguir «produtos biocidas dos tipos 2 e 4»), bem como dos tipos de produtos 14 e 18; e

–        que proíbe a publicidade dirigida ao público em geral relativa aos produtos biocidas dos tipos de produtos 2 e 4, bem como dos tipos de produtos 14 e 18.

 Quanto à proibição de certas práticas comerciais

29      A título preliminar, importa recordar que o artigo L. 522‑18 do Código do Ambiente proíbe, em relação aos produtos biocidas, práticas comerciais como os descontos, os abatimentos, as reduções, a diferenciação das condições gerais e especiais de venda, a entrega de unidades gratuitas e quaisquer práticas equivalentes.

30      Decorre das indicações que figuram na decisão de reenvio que os artigos L. 522‑18 e R. 522‑16‑1 do Código do Ambiente não dizem respeito às condições que os produtos biocidas dos tipos de produtos 14 e 18 têm de preencher para beneficiar de uma autorização de colocação no mercado, mas proíbem certas práticas comerciais na venda destes produtos, pelo que apenas regulam as modalidades de comercialização dos mesmos.

31      Em primeiro lugar, há que salientar que, conforme resulta do artigo 1.o, n.o 1, do Regulamento n.o 528/2012, este visa melhorar o funcionamento do mercado interno através da harmonização das normas relativas à disponibilização no mercado e à utilização de produtos biocidas, assegurando simultaneamente um elevado nível de proteção da saúde humana e animal e do ambiente. Para este efeito, o artigo 1.o, n.o 2, alínea d), deste regulamento indica que este estabelece regras para a disponibilização no mercado e a utilização de produtos biocidas num ou em vários Estados‑Membros ou na União.

32      O artigo 3.o, n.o 1, alínea i), do Regulamento n.o 528/2012 define a disponibilização no mercado como qualquer fornecimento, no âmbito de uma atividade comercial, de um produto biocida, ou de um artigo tratado, para distribuição ou utilização, a título oneroso ou gratuito, ao passo que a utilização é definida no artigo 3.o, n.o 1, alínea k), deste regulamento como todas as operações efetuadas com um produto biocida, incluindo a armazenagem, o manuseamento, a mistura e a aplicação, com exceção das operações realizadas com vista à exportação do produto biocida ou do artigo tratado para fora da União.

33      Daqui decorre que as regras do referido regulamento relativas à disponibilização no mercado e à utilização de produtos biocidas se revelam suficientemente amplas para abranger as práticas comerciais ligadas à venda destes produtos. Todavia, há que observar, à semelhança do advogado‑geral nos n.os 28 a 30 das suas conclusões, que o mesmo regulamento não contém nenhuma disposição destinada a harmonizar as regras que enquadram tais práticas. Além disso, conforme resulta de uma leitura conjugada dos artigos 17.o, 19.o e 20.o do Regulamento n.o 528/2012, lidos à luz dos seus considerandos 2, 3, 28 e 31, este regulamento visa instituir um regime de autorização prévia que permita a disponibilização no mercado de produtos biocidas e estabelecer os princípios comuns de avaliação dos pedidos de autorização destes produtos sem, no entanto, harmonizar todos os aspetos referentes à comercialização dos mesmos.

34      Por conseguinte, há que considerar que o Regulamento n.o 528/2012 não visa harmonizar as regras relativas às práticas comerciais ligadas à venda de produtos biocidas, como as que constam dos artigos L. 522‑18 e R. 522‑16‑1 do Código do Ambiente.

35      Daqui resulta que este regulamento não se opõe a uma regulamentação nacional que proíbe certas práticas comerciais na venda de produtos biocidas, como os produtos biocidas dos tipos de produtos 14 e 18.

36      Em segundo lugar, para dar uma resposta útil ao órgão jurisdicional de reenvio, tendo em conta o que foi recordado no n.o 27 do presente acórdão, há que determinar se o artigo 34.o TFUE se opõe a essa regulamentação nacional.

37      A este respeito, resulta de jurisprudência constante que qualquer medida de um Estado‑Membro suscetível de entravar, direta ou indiretamente, efetiva ou potencialmente, o comércio na União deve ser considerada uma medida de efeito equivalente a restrições quantitativas na aceção desta disposição (Acórdãos de 11 de julho de 1974, Dassonville, 8/74, EU:C:1974:82, n.o 5, e de 3 de julho de 2019, Delfarma, C‑387/18, EU:C:2019:556, n.o 20 e jurisprudência referida).

38      Todavia, não é suscetível de entravar direta ou indiretamente, efetiva ou potencialmente, o comércio entre os Estados‑Membros, na aceção dessa jurisprudência, a aplicação a produtos provenientes de outros Estados‑Membros de disposições nacionais que limitem ou proíbam certas modalidades de venda, desde que essas disposições se apliquem a todos os operadores que exercem a sua atividade no território nacional e afetem do mesmo modo, tanto de direito quanto de facto, a comercialização dos produtos nacionais e dos produtos provenientes de outros Estados‑Membros. Com efeito, desde que essas condições estejam preenchidas, a aplicação de regulamentações desse tipo à venda de produtos provenientes de outro Estado‑Membro que obedeçam às regras aprovadas por esse Estado não é suscetível de impedir o seu acesso ao mercado ou de o dificultar mais do que dificulta o acesso dos produtos nacionais (Acórdãos de 10 de fevereiro de 2009, Comissão/Itália, C‑110/05, EU:C:2009:66, n.o 36, de 2 de dezembro de 2010, Ker‑Optika, C‑108/09, EU:C:2010:725, n.o 51, e de 21 de setembro de 2016, Etablissements Fr. Colruyt, C‑221/15, EU:C:2016:704, n.o 35).

39      No caso em apreço, como foi salientado no n.o 30 do presente acórdão, os artigos L. 522‑18 e R. 522‑16‑1 do Código do Ambiente não dizem respeito às condições que os produtos biocidas dos tipos de produtos 14 e 18 têm de preencher para beneficiar de uma autorização de colocação no mercado. Na realidade, proíbem certas práticas comerciais na venda destes produtos, pelo que apenas regulam as modalidades de comercialização dos mesmos. Daqui resulta que se deve considerar que estas disposições regulam modalidades de venda na aceção da jurisprudência do Tribunal de Justiça referida no n.o 38 do presente acórdão.

40      Ora, uma regulamentação nacional que regula as modalidades de venda de certos produtos só pode, contudo, eximir‑se da proibição que figura no artigo 34.o TFUE se preencher as duas condições enunciadas no n.o 38.

41      Quanto à primeira condição, resulta dos elementos fornecidos ao Tribunal de Justiça pelo órgão jurisdicional de reenvio que os artigos L. 522‑18 e R. 522‑16‑1 do Código do Ambiente, referidos no n.o 39 do presente acórdão, se aplicam indistintamente a todos os operadores em causa que exerçam a sua atividade no território francês.

42      No que respeita à segunda condição, compete a este órgão jurisdicional apreciar se estas disposições afetam do mesmo modo, tanto de direito como de facto, a comercialização dos produtos nacionais e dos produtos provenientes de outros Estados‑Membros.

43      No caso em apreço, não resulta dos elementos apresentados ao Tribunal de Justiça que a regulamentação em causa no processo principal faça uma distinção consoante a origem dos produtos biocidas em causa. No entanto, há que verificar se esta regulamentação não é, de facto, suscetível de dificultar mais o acesso ao mercado francês dos produtos biocidas em causa provenientes de outros Estados‑Membros do que dificulta o acesso dos produtos nacionais.

44      A este respeito, uma regulamentação nacional que proíbe certas práticas comerciais na venda de certos tipos de produtos biocidas é, em princípio, suscetível de restringir o volume total de vendas destes produtos no Estado‑Membro em questão e pode, por conseguinte, afetar o volume de vendas dos referidos produtos provenientes de outros Estados‑Membros. Todavia, isso não basta para qualificar tal regulamentação de medida de efeito equivalente (v., neste sentido, Acórdão de 23 de fevereiro de 2006, A‑Punkt Schmuckhandel, C‑441/04, EU:C:2006:141, n.o 21 e jurisprudência referida).

45      É certo que, como alegam a Comissão e as recorrentes no processo principal, práticas comerciais como os abatimentos e as reduções, que são objeto dos artigos L. 522‑18 e R. 522‑16‑1 do Código do Ambiente, constituem métodos de comercialização que se podem revelar eficazes para permitir o acesso de produtos provenientes de outros Estados‑Membros a um mercado nacional, uma vez que estes métodos influenciam o preço de venda destes produtos.

46      Todavia, o facto de uma regulamentação nacional proibir métodos de comercialização pretensamente eficazes não constitui um elemento suficiente para considerar que esta regulamentação é abrangida pela proibição prevista no artigo 34.o TFUE. Com efeito, tal regulamentação só constitui uma medida de efeito equivalente se a proibição dos métodos de comercialização em causa afetar mais os produtos provenientes de outros Estados‑Membros do que afeta os produtos nacionais.

47      Nestas condições, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio determinar se a proibição de certas práticas comerciais, prevista nos artigos L. 522‑18 e R. 522‑16‑1 do Código do Ambiente, afeta mais o acesso ao mercado dos produtos biocidas em causa originários de outros Estados‑Membros do que o acesso desses produtos provenientes de França. Particularmente, cabe‑lhe apreciar se, como sustentou o Governo francês na audiência, estas disposições abrangem um âmbito estrito de métodos de comercialização dos produtos biocidas em causa e se, por conseguinte, os métodos de comercialização que não são proibidos pelas referidas disposições permitem garantir que os produtos provenientes de outros Estados‑Membros podem aceder ao mercado nacional.

48      Se, no fim desse exame, o referido órgão jurisdicional verificar que a regulamentação nacional em causa no processo principal afeta mais o acesso ao mercado francês dos produtos biocidas em causa provenientes de outros Estados‑Membros do que o acesso desses produtos provenientes de França, cabe‑lhe determinar se tal regulamentação é justificada por uma ou várias das razões de interesse geral enumeradas no artigo 36.o TFUE ou por uma ou várias das exigências imperativas de interesse geral reconhecidas pela jurisprudência do Tribunal de Justiça.

49      A este respeito, em primeiro lugar, resulta da decisão de reenvio que o artigo L. 522‑18 do Código do Ambiente tem por objetivo prevenir as implicações negativas que a utilização excessiva de certos tipos de produtos biocidas representa para a saúde pública e para o ambiente.

50      Ora, em conformidade com jurisprudência constante, importa recordar, por um lado, que a saúde e a vida das pessoas ocupam o primeiro lugar entre os bens e interesses protegidos pelo Tratado e que cabe aos Estados‑Membros decidir o nível a que pretendem assegurar a proteção da saúde pública, bem como o modo como esse nível deve ser alcançado. Dado que o mesmo pode variar de um Estado‑Membro para outro, há que reconhecer aos Estados‑Membros uma margem de apreciação (v. Acórdão de 2 de dezembro de 2010, Ker‑Optika, C‑108/09, EU:C:2010:725, n.o 58).

51      Por outro lado, resulta de jurisprudência constante que a proteção do ambiente constitui uma razão imperiosa de interesse geral suscetível de justificar uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa (v., neste sentido, Acórdão de 6 de outubro de 2015, Capoda Import‑Export, C‑354/14, EU:C:2015:658, n.o 43).

52      Por conseguinte, resulta das indicações fornecidas ao Tribunal de Justiça que a regulamentação em causa no processo principal é suscetível de responder a razões imperiosas de interesse geral suscetíveis de justificar uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa, o que cabe, todavia, ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

53      Em segundo lugar, cabe às autoridades nacionais, em cada caso concreto, demonstrar que a regulamentação nacional em causa respeita o princípio da proporcionalidade, ou seja, que é necessária para realizar o objetivo invocado, e que este objetivo não poderia ser atingido através de proibições ou limitações de menor amplitude ou que afetem menos o comércio na União. Neste sentido, incumbe a essas autoridades apresentar as provas necessárias para o efeito. As razões justificativas suscetíveis de ser invocadas por um Estado‑Membro devem, por conseguinte, ser acompanhadas de uma análise da adequação e da proporcionalidade da medida adotada por esse Estado, bem como dos elementos precisos que permitam sustentar a sua argumentação (v. Acórdão de 23 de dezembro de 2015, Scotch Whisky Association e o., C‑333/14, EU:C:2015:845, n.os 53 e 54).

54      Daqui decorre que, quando examina uma regulamentação nacional à luz da justificação relativa à proteção da saúde e da vida das pessoas, na aceção do artigo 36.o TFUE, um órgão jurisdicional nacional deve examinar de maneira objetiva se os elementos de prova apresentados pelo Estado‑Membro em causa permitem razoavelmente considerar que os meios escolhidos são adequados para realizar os objetivos prosseguidos e se é possível alcançar estes últimos através de medidas menos restritivas da livre circulação de mercadorias (v., neste sentido, Acórdão de 23 de dezembro de 2015, Scotch Whisky Association e o., C‑333/14, EU:C:2015:845, n.o 59).

55      A este respeito, quanto à adequação da regulamentação nacional em causa no processo principal para alcançar os objetivos invocados, o Governo francês sublinhou que esta regulamentação visa prevenir e reduzir a exposição da população, dos animais e do ambiente aos produtos biocidas em causa, limitando os incentivos a uma utilização demasiado grande e por vezes desadequada destes produtos.

56      Embora a referida regulamentação não pareça suscetível de eliminar todos os riscos de dispersão desnecessária dos produtos biocidas em causa, não deixa de ser verdade que, ao afastar a possibilidade de um adquirente beneficiar de qualquer vantagem financeira na compra destes produtos, é suscetível de evitar compras desadequadas dos referidos produtos e, por conseguinte, de natureza a reduzir o risco associado à exposição da população, dos animais e do ambiente a uma utilização excessiva dos mesmos produtos biocidas. Com efeito, como salientou o Governo francês, esta regulamentação mostra‑se adequada para evitar fenómenos de acumulação destes produtos no ambiente e na poluição das águas que pode daí resultar. Decorre de todas as considerações precedentes que a regulamentação em causa no processo principal se afigura adequada para alcançar os objetivos de proteção da saúde humana e do ambiente, o que cabe, no entanto, ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

57      Quanto ao caráter necessário e proporcionado da proibição de certas práticas comerciais na venda de determinados tipos de produtos biocidas, há que considerar que, como salientou o advogado‑geral nos n.os 72 a 75 das suas conclusões, esta proibição não vai além do necessário, uma vez que as medidas de informações adicionais exigidas na venda destes produtos, isto é, as previstas no âmbito do artigo 17.o, n.o 5, e do artigo 72.o, n.o 1, do Regulamento n.o 528/2012, não podem compensar a atratividade de uma oferta de abatimentos e de reduções ou da entrega de amostras gratuitas de produtos biocidas aquando da compra dos mesmos.

58      Por outro lado, resulta das indicações do órgão jurisdicional de reenvio, por um lado, que a regulamentação em causa no processo principal visa apenas proibir a prática de abatimentos e de reduções na venda de produtos biocidas dos tipos de produtos 14 e 18, ou seja, os que apresentam riscos mais elevados para a saúde humana e, por outro, que esta regulamentação não se aplica aos produtos biocidas elegíveis para o procedimento de autorização simplificado ao abrigo do artigo 25.o do Regulamento n.o 528/2012.

59      Assim, os artigos 34.o e 36.o TFUE devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma regulamentação nacional que proíbe certas práticas comerciais, como os descontos, os abatimentos, as reduções, a diferenciação das condições gerais e especiais de venda, a entrega de unidades gratuitas e todas as práticas equivalentes, relativas a produtos biocidas dos tipos de produtos 14 e 18, uma vez que essa regulamentação seja justificada por objetivos de proteção da saúde e da vida das pessoas e do ambiente, e seja adequada a garantir a concretização destes objetivos e não vá além do necessário para os alcançar, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

 Quanto às obrigações em matéria de publicidade dirigida aos profissionais

60      A título preliminar, como foi recordado no n.o 31 do presente acórdão, em conformidade com o seu artigo 1.o, n.o 1, o Regulamento n.o 528/2012 visa melhorar o funcionamento do mercado interno através da harmonização das normas relativas à disponibilização no mercado e à utilização de produtos biocidas, assegurando simultaneamente um elevado nível de proteção da saúde humana e animal e do ambiente. Como salientou o advogado‑geral no n.o 86 das suas conclusões, o artigo 72.o deste regulamento é a única disposição do mesmo que se refere à publicidade dos produtos biocidas. Consequentemente, é à luz desta disposição que se deve apreciar se o referido regulamento se opõe a uma regulamentação nacional que exige a aposição de uma menção na publicidade dirigida aos profissionais para certos tipos de produtos biocidas.

61      Assim, há que considerar que o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 72.o do Regulamento n.o 528/2012 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional que exige a aposição de uma menção, além da prevista neste artigo, na publicidade dirigida aos profissionais relativa aos produtos biocidas dos tipos de produtos 2 e 4, bem como dos tipos de produtos 14 e 18.

62      A este respeito, o artigo 72.o do Regulamento n.o 528/2012 prevê, no seu n.o 1, que a publicidade aos produtos biocidas deve respeitar o Regulamento n.o 1272/2008, e incluir menções precisas que devem ser legíveis e distinguir‑se claramente do conteúdo geral do anúncio. Estas menções enunciam: «Utilize os biocidas com cuidado. Leia sempre o rótulo e a informação relativa ao produto antes de o utilizar». O n.o 2 do referido artigo limita‑se a referir que os anunciantes podem substituir o termo «biocidas» nas menções exigidas por uma referência clara ao tipo de produto anunciado. O n.o 3 do mesmo artigo dispõe, por sua vez, que a publicidade aos produtos biocidas não deve referir‑se ao produto de maneira enganosa no que diz respeito aos riscos do produto para a saúde humana, para a saúde animal ou para o ambiente, ou à sua eficácia. Esta última disposição proíbe igualmente menções como «produto biocida de baixo risco», «não tóxico» ou «respeitador do ambiente».

63      Daqui resulta que, com o artigo 72.o do Regulamento n.o 528/2012, o legislador da União pretendeu enquadrar, de maneira detalhada e exaustiva, a formulação das menções relativas aos riscos associados à utilização de produtos biocidas que podem figurar na publicidade destes produtos, visto que este artigo prevê a existência de uma menção obrigatória, proíbe expressamente certas menções e visa, de um modo geral, proibir menções publicitárias suscetíveis de enganar o utilizador quanto aos riscos que tais produtos podem apresentar.

64      Por outro lado, resulta dos considerandos 1 e 3 do Regulamento n.o 528/2012 que o legislador da União quis procurar um equilíbrio específico entre a livre circulação dos produtos biocidas e um elevado nível de proteção da saúde humana e animal e do ambiente.

65      Resulta de uma interpretação literal do artigo 72.o do Regulamento n.o 528/2012, lido à luz dos seus considerandos 1 e 3, que o domínio referente às menções relativas aos riscos associados à utilização de produtos biocidas que podem ser utilizadas no âmbito da publicidade destes produtos foi harmonizado, de maneira exaustiva, pelo legislador da União.

66      Esta interpretação é corroborada pela exigência de legibilidade destas menções, conforme expressa na última frase do artigo 72.o, n.o 1, do Regulamento n.o 528/2012. Com efeito, há que salientar que as menções complementares às referidas nessa disposição são suscetíveis de prejudicar a legibilidade destas últimas, mesmo que essas menções complementares não contrariem os objetivos de proteção da saúde humana e animal e do ambiente.

67      Por conseguinte, o artigo 72.o do Regulamento n.o 528/2012 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional que exige a aposição de uma menção, além da prevista neste artigo, na publicidade dirigida aos profissionais relativa aos produtos biocidas dos tipos de produtos 2 e 4, bem como dos tipos de produtos 14 e 18.

 Quanto à proibição da publicidade dirigida ao público em geral

68      Em primeiro lugar, há que determinar se o Regulamento n.o 528/2012 se opõe a uma regulamentação nacional como a que resulta dos artigos L. 522‑5‑3 e R. 522‑16‑2 do Código do Ambiente, que proíbe a publicidade dirigida ao público em geral relativa aos produtos biocidas dos tipos de produtos 2 e 4, bem como dos tipos de produtos 14 e 18.

69      Como foi realçado no n.o 63 do presente acórdão, resulta do artigo 72.o do Regulamento n.o 528/2012 que o legislador da União pretendeu enquadrar, de maneira detalhada e exaustiva, a formulação das menções relativas aos riscos associados à utilização de produtos biocidas que podem figurar na publicidade destes produtos. Todavia, este legislador não pretendeu regular todos os aspetos referentes à publicidade dos produtos biocidas e, particularmente, excluir a possibilidade de os Estados‑Membros proibirem a publicidade dirigida ao público em geral.

70      Daqui decorre que o artigo 72.o do Regulamento n.o 528/2012 não se opõe a uma regulamentação nacional que proíbe a publicidade dirigida ao público em geral relativa aos produtos biocidas dos tipos de produtos 2 e 4, bem como dos tipos de produtos 14 e 18.

71      Dito isto, em segundo lugar, há que apreciar se o artigo 34.o TFUE se opõe a essa regulamentação.

72      A este respeito, como foi recordado nos n.os 37 e 38 do presente acórdão, há que verificar se essa regulamentação constitui uma regulamentação que regula as modalidades de venda de produtos, na aceção da jurisprudência referida no n.o 38 do presente acórdão, que se aplica a todos os operadores em causa que exercem a sua atividade no território nacional e que afeta do mesmo modo, tanto de direito como de facto, a comercialização dos produtos nacionais e dos produtos provenientes de outros Estados‑Membros.

73      No presente caso, importa recordar que, atendendo às indicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, os artigos L. 522‑5‑3 e R. 522‑16‑2 do Código do Ambiente não dizem respeito às condições que os produtos biocidas dos tipos de produtos 2 e 4 e dos tipos de produtos 14 e 18 têm de preencher para beneficiar de uma autorização de colocação no mercado. Em contrapartida, estas disposições preveem uma proibição de fazer publicidade dirigida ao público em geral por ocasião da venda destes produtos, pelo que apenas regulam as modalidades de comercialização dos referidos produtos. Daqui resulta que se pode considerar que as referidas disposições regulam modalidades de venda na aceção da jurisprudência referida no n.o 38 do presente acórdão.

74      Ora, uma regulamentação nacional que regula as modalidades de venda de certos produtos só pode, no entanto, eximir‑se do âmbito de aplicação do artigo 34.o TFUE se preencher as duas condições enunciadas no n.o 38 do presente acórdão.

75      Quanto à primeira condição, resulta dos elementos fornecidos ao Tribunal de Justiça pelo órgão jurisdicional de reenvio que os artigos L. 522‑5‑3 e R. 522‑16‑2 do Código do Ambiente se aplicam indistintamente a todos os operadores em causa que exerçam a sua atividade no território francês.

76      Quanto à segunda condição, compete a este órgão jurisdicional apreciar se essas disposições afetam do mesmo modo, tanto de direito como de facto, a comercialização dos produtos nacionais e dos produtos provenientes de outros Estados‑Membros.

77      No caso em apreço, não resulta dos elementos de que dispõe o Tribunal de Justiça que a regulamentação em causa no processo principal faça uma distinção consoante a origem dos produtos biocidas em causa. No entanto, há que verificar se esta regulamentação não é, de facto, suscetível de dificultar mais o acesso ao mercado francês dos produtos biocidas em causa provenientes de outros Estados‑Membros do que dificulta o acesso dos produtos nacionais.

78      A este respeito, embora o Tribunal de Justiça tenha declarado que uma regulamentação nacional que limita ou proíbe determinadas formas de publicidade relativa a certos produtos pode ser suscetível de restringir o volume de vendas dos mesmos e, por conseguinte, ter um impacto mais significativo nos produtos provenientes de outros Estados‑Membros, condicionou, todavia, este entendimento à identificação de uma dificuldade específica que caracterize o mercado de um dado produto com a qual se depara o operador para entrar no mercado nacional, como a existência de práticas sociais tradicionais, de hábitos ou usos locais ou ainda pela circunstância de o método de venda visado pela proibição constituir possivelmente o único método para aceder ao mercado nacional em causa (v., neste sentido, Acórdãos de 8 de março de 2001, Gourmet International Products, C‑405/98, EU:C:2001:135, n.os 19 e 21, de 19 de outubro de 2016, Deutsche Parkinson Vereinigung, C‑148/15, EU:C:2016:776, n.o 25, e de 15 de julho de 2021, DocMorris, C‑190/20, EU:C:2021:609, n.o 41).

79      Ora, não resulta dos elementos dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que o mercado francês dos produtos biocidas se caracteriza pela existência de uma ou de várias dificuldades específicas, na aceção da jurisprudência referida no número anterior do presente acórdão, o que cabe, todavia, ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, pelo que não parece que a proibição de publicidade dirigida ao público em geral relativa a certos produtos biocidas afete mais a comercialização dos produtos provenientes de outros Estados‑Membros.

80      Se, no fim desse exame, esse órgão jurisdicional verificar, contudo, que a regulamentação em causa no processo principal afeta mais o acesso ao mercado francês dos produtos biocidas provenientes de outros Estados‑Membros do que afeta o acesso desses produtos provenientes de França, cabe‑lhe determinar se tal regulamentação é justificada por uma ou várias das razões de interesse geral enumeradas no artigo 36.o TFUE ou por uma ou várias das exigências imperativas reconhecidas pela jurisprudência do Tribunal de Justiça.

81      A este respeito, conforme resulta do n.o 49 do presente acórdão, a decisão de reenvio precisa que a regulamentação em causa no processo principal tem por objetivo prevenir as implicações negativas que a utilização excessiva de certos produtos biocidas representa para a saúde pública e para o ambiente.

82      Assim, há que concluir que esta regulamentação é adequada para alcançar os objetivos de proteção da saúde humana e do ambiente, tendo em conta que prevê uma proibição da publicidade dirigida ao público em geral relativa a alguns desses produtos, o que constitui um meio que permite limitar os incentivos à compra e à utilização de tais produtos.

83      Quanto ao caráter necessário e proporcionado da referida regulamentação, há que considerar que, como salientou o advogado‑geral nos n.os 120 e 121 das suas conclusões, a proibição da publicidade dirigida ao público em geral relativa a certos produtos biocidas não excede o necessário para atingir os objetivos prosseguidos. Com efeito, como alegou o Governo francês, por um lado, esta regulamentação visa apenas a publicidade dirigida ao público em geral e não proíbe, por conseguinte, a publicidade dirigida aos profissionais. Por outro lado, a referida regulamentação tem um alcance limitado uma vez que não visa todos os produtos biocidas, mas apenas os abrangidos pelos tipos de produtos 2 e 4 e tipos de produtos 14 e 18, isto é, os que apresentam riscos mais elevados para a saúde humana, não sendo aplicável aos produtos biocidas elegíveis para o procedimento de autorização simplificado ao abrigo do artigo 25.o do Regulamento n.o 528/2012.

84      O artigo 72.o do Regulamento n.o 528/2012 não se opõe, assim, a uma regulamentação nacional que proíbe a publicidade dirigida ao público em geral relativa aos produtos biocidas dos tipos de produtos 2 e 4, bem como dos tipos de produtos 14 e 18. O mesmo se aplica aos artigos 34.o e 36.o TFUE, uma vez que essa regulamentação seja justificada por objetivos de proteção da saúde e da vida das pessoas e do ambiente, seja adequada a garantir a concretização destes objetivos e não vá além do necessário para os alcançar, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

85      Atendendo a todas as considerações precedentes, há que responder à questão submetida que, por um lado, o artigo 72.o do Regulamento n.o 528/2012 deve ser interpretado no sentido de que:

–        se opõe a uma regulamentação nacional que exige a aposição de uma menção, além da prevista neste artigo, na publicidade dirigida aos profissionais relativa aos produtos biocidas dos tipos de produtos 2 e 4, bem como dos tipos de produtos 14 e 18;

–        não se opõe a uma regulamentação nacional que proíbe a publicidade dirigida ao público em geral relativa aos produtos biocidas dos tipos de produtos 2 e 4, bem como dos tipos de produtos 14 e 18;

e, por outro, os artigos 34.o e 36.o TFUE devem ser interpretados no sentido de que:

–        não se opõem a uma regulamentação nacional que proíbe certas práticas comerciais, como os descontos, os abatimentos, as reduções, a diferenciação das condições gerais e especiais de venda, a entrega de unidades gratuitas e todas as práticas equivalentes, relativas a produtos biocidas dos tipos de produtos 14 e 18, desde que essa regulamentação seja justificada por objetivos de proteção da saúde e da vida das pessoas e do ambiente, seja adequada a garantir a concretização destes objetivos e não vá além do que é necessário para os alcançar, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar;

–        não se opõem a uma regulamentação nacional que proíbe a publicidade dirigida ao público em geral relativa aos produtos biocidas dos tipos de produtos 2 e 4, bem como dos tipos de produtos 14 e 18, desde que essa regulamentação seja justificada por objetivos de proteção da saúde e da vida das pessoas e do ambiente, seja adequada a garantir a concretização destes objetivos e não vá além do que é necessário para os alcançar, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

 Quanto às despesas

86      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

1)      O artigo 72.o do Regulamento (UE) n.o 528/2012 do Parlamento e do Conselho, de 22 de maio de 2012, relativo à disponibilização no mercado e à utilização de produtos biocidas, conforme alterado pelo Regulamento (UE) n.o 334/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março de 2014, deve ser interpretado no sentido de que:

–        se opõe a uma regulamentação nacional que exige a aposição de uma menção, além da prevista neste artigo, na publicidade dirigida aos profissionais relativa aos produtos biocidas dos tipos de produtos 2 e 4, abrangidos pelo grupo 1 destes tipos de produtos, que figura no anexo V deste regulamento, bem como dos tipos de produtos 14 e 18, abrangidos pelo grupo 3 destes tipos de produtos, que figuram no anexo V do referido regulamento;

–        não se opõe a uma regulamentação nacional que proíbe a publicidade dirigida ao público em geral relativa aos produtos biocidas dos tipos de produtos 2 e 4, abrangidos pelo grupo 1 destes tipos de produtos, que figuram no anexo V do Regulamento n.o 528/2012, conforme alterado pelo Regulamento n.o 334/2014, bem como dos tipos de produtos 14 e 18, abrangidos pelo grupo 3 destes tipos de produtos, que figuram no anexo V deste regulamento.

2)      Os artigos 34.o e 36.o TFUE devem ser interpretados no sentido de que:

–        não se opõem a uma regulamentação nacional que proíbe certas práticas comerciais, como os descontos, os abatimentos, as reduções, a diferenciação das condições gerais e especiais de venda, a entrega de unidades gratuitas e todas as práticas equivalentes, relativas a produtos biocidas dos tipos de produtos 14 e 18, abrangidos pelo grupo 3 destes tipos de produtos, que figuram no anexo V do Regulamento n.o 528/2012, conforme alterado pelo Regulamento n.o 334/2014, desde que essa regulamentação seja justificada por objetivos de proteção da saúde e da vida das pessoas e do ambiente, seja adequada a garantir a concretização destes objetivos e não vá além do que é necessário para os alcançar, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar;

–        não se opõem a uma regulamentação nacional que proíbe a publicidade dirigida ao público em geral relativa aos produtos biocidas dos tipos de produtos 2 e 4, abrangidos pelo grupo 1 destes tipos de produtos, que figuram no anexo V deste regulamento, bem como dos tipos de produtos 14 e 18, abrangidos pelo grupo 3 destes tipos de produtos, que figuram no anexo V do referido regulamento, desde que essa regulamentação seja justificada por objetivos de proteção da saúde e da vida das pessoas e do ambiente, seja adequada a garantir a concretização destes objetivos e não vá além do que é necessário para os alcançar, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

Assinaturas


*      Língua do processo: francês.


i      Na sequência de uma verificação de texto por parte da Unidade Portuguesa, houve necessidade de corrigir este acórdão, posteriormente à sua primeira publicação em linha.