ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

7 de fevereiro de 2023 (*)

«Reenvio prejudicial — Ambiente — Libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente modificados — Diretiva 2001/18/CE — Artigo 3.o, n.o 1 — Anexo I B, ponto 1 — Âmbito de aplicação — Isenções — Técnicas/métodos de modificação genética que têm sido convencionalmente utilizadas e têm um índice de segurança longamente comprovado — Mutagénese aleatória in vitro»

No processo C‑688/21,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, França), por Decisão de 8 de novembro de 2021, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 17 de novembro de 2021, no processo

Confédération paysanne,

Réseau Semences Paysannes,

Les Amis de la Terre France,

Collectif Vigilance OGM et Pesticides 16,

Vigilance OG2M,

CSFV 49,

OGM: dangers,

Vigilance OGM 33,

Fédération Nature et Progrès

contra

Premier ministre,

Ministre de l’Agriculture et de l’Alimentation,

sendo interveniente:

Fédération française des producteurs d’oléagineux et de protéagineux,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, L. Bay Larsen (relator), vice‑presidente, A. Arabadjiev, A. Prechal, E. Regan e L. S. Rossi, presidentes de secção, M. Ilešič, S. Rodin, N. Piçarra, I. Jarukaitis, A. Kumin, I. Ziemele, M. Gavalec, Z. Csehi e O. Spineanu‑Matei, juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretária: R. Stefanova‑Kamisheva, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 20 de junho de 2022,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Confédération paysanne, da Réseau Semences Paysannes, da Les Amis de la Terre France, do Collectif Vigilance OGM et Pesticides 16, da Vigilance OG2M, da CSFV 49, da OGM: dangers, da Vigilance OGM 33 e da Fédération Nature et Progrès, por G. Tumerelle, avocat,

–        em representação da Fédération française des producteurs d’oléagineux et de protéagineux, por M.‑A. de Chillaz e B. Le Bret, avocats,

–        em representação do Governo francês, por G. Bain e J.‑L. Carré, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por F. Castilla Contreras, B. Eggers, I. Galindo Martín e C. Valero, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 27 de outubro de 2022,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 3.o, n.o 1, e do anexo I B, ponto 1, da Diretiva 2001/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de março de 2001, relativa à libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente modificados e que revoga a Diretiva 90/220/CEE do Conselho (JO 2001, L 106, p. 1).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Confédération paysanne, a Réseau Semences Paysannes, a Les Amis de la Terre France, o Collectif Vigilance OGM et Pesticides 16, a Vigilance OG2M, a CFSV 49, a OGM: dangers, a Vigilance OGM 33 e a Fédération Nature et Progrès ao Premier ministre (Primeiro‑Ministro, França) e ao ministre de l’Agriculture et de l’Alimentation (Ministro da Agricultura e Alimentação, França) a respeito da execução de uma intimação judicial para adotar medidas destinadas, particularmente, a fixar a lista das técnicas/métodos de mutagénese que têm sido convencionalmente utilizadas num certo número de aplicações e têm um índice de segurança longamente comprovado que devem ser excluídos do âmbito de aplicação da regulamentação francesa que procede à transposição da Diretiva 2001/18.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        O considerando 17 da Diretiva 2001/18 tem a seguinte redação:

«A presente diretiva não deve ser aplicável a organismos obtidos por meio de certas técnicas de modificação genética que têm sido convencionalmente utilizadas num certo número de aplicações e têm um índice de segurança longamente comprovado.»

4        Nos termos do artigo 1.o desta diretiva:

«Em conformidade com o princípio da precaução, a presente diretiva tem por objetivo a aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros e a proteção da saúde humana e do ambiente quando:

–        são efetuadas libertações no ambiente deliberadas de organismos geneticamente modificados para qualquer fim diferente da colocação no mercado, no território da [União Europeia],

–        são colocados no mercado, no território da [União], produtos que contenham ou sejam constituídos por organismos geneticamente modificados.»

5        O artigo 2.o da referida diretiva dispõe:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

[…]

2) “Organismo geneticamente modificado” (OGM), qualquer organismo, com exceção do ser humano, cujo material genético tenha sido modificado de uma forma que não ocorre naturalmente por meio de cruzamentos e/ou de recombinação natural.

No âmbito desta definição:

a)      A modificação genética ocorre, pelo menos, quando são utilizadas as técnicas referidas na parte 1 do anexo I A;

b)      Não se considera que as técnicas referidas na parte 2 do anexo I A resultem em modificações genéticas;

[…]»

6        O artigo 3.o, n.o 1, da mesma diretiva prevê:

«A presente diretiva não é aplicável aos organismos obtidos através das técnicas de modificação genética enumeradas no anexo I B.»

7        Sob a epígrafe «Técnicas referidas no n.o 2 do artigo 2.o», o anexo I A da Diretiva 2001/18 enuncia:

«PARTE 1

As técnicas de modificação genética referidas no [ponto] 2, alínea a), do artigo 2.o, são, nomeadamente:

1)      Técnicas de recombinação de ácidos nucleicos que envolvam a formação de novas combinações de material genético através da inserção de moléculas de ácidos nucleicos […]

2)      Técnicas […] que envolvam a introdução direta num organismo de material geneticamente transmissível preparado fora desse organismo;

3)      Técnicas de fusão celular (incluindo a fusão protoplástica) ou de hibridação […]

PARTE 2

Técnicas referidas no n.o 2, alínea b), do artigo 2.o, cujos resultados não são considerados modificações genéticas desde que não envolvam a utilização de moléculas recombinantes de ácidos nucleicos ou de organismos geneticamente modificados obtidos por técnicas/métodos diferentes dos excluídos pelo anexo I B:

1)      Fertilização in vitro,

2)      Processos naturais como a conjugação, a transdução e a transformação,

3)      Indução da poliploidia.»

8        Sob a epígrafe «Técnicas referidas no artigo 3.o», o anexo I B desta diretiva prevê:

«Ficam excluídos do âmbito da presente diretiva os organismos resultantes das seguintes técnicas/métodos de modificação genética, desde que estes não envolvam a utilização de moléculas recombinantes de ácidos nucleicos ou de [OGM] diferentes dos obtidos por uma ou mais das técnicas/métodos:

1)      Mutagénese;

2)      Fusão celular (incluindo a fusão protoplástica) de células vegetais de organismos resultantes que podem trocar material genético através dos métodos tradicionais de cultura.»

 Direito francês

9        Nos termos do artigo L. 531‑2 do code de l’environnement (Código do Ambiente):

«Não estão submetidos às disposições do presente título e dos artigos L. 125‑3 e L. 515‑13 os organismos geneticamente modificados obtidos por técnicas que, pelo seu caráter natural, não se considera resultarem em modificações genéticas ou por aquelas que tenham sido objeto de utilização tradicional sem inconvenientes demonstrados para a saúde pública ou o ambiente.

A lista destas técnicas é fixada por decreto, após parecer do Haut Conseil des biotechnologies (Conselho Superior da Biotecnologia).»

10      O artigo D. 531‑2 deste código dispõe:

«As técnicas referidas no artigo L. 531‑2, que não se considera darem origem a modificações genéticas, são as seguintes:

[…]

2.o Sob condição de não implicarem a utilização de organismos geneticamente modificados como organismos recetores ou parentais:

a)      A mutagénese;

[…]»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

11      Por recurso interposto em 12 de março de 2015, os recorrentes no processo principal, que são um sindicato agrícola francês e oito associações que têm por objeto a proteção do ambiente e a divulgação de informação sobre os perigos que os OGM apresentam, pediram ao órgão jurisdicional de reenvio, o Conseil d'État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, França), por um lado, que anulasse a decisão tácita de indeferimento, pelo Primeiro‑Ministro, do seu pedido destinado, nomeadamente, em primeiro lugar, à revogação do artigo D. 531‑2 do Código do Ambiente, que transpôs a Diretiva 2001/18, que exclui a mutagénese da definição das técnicas que dão origem a uma modificação genética na aceção deste código e, em segundo lugar, à proibição do cultivo e da comercialização de variedades de colza resistentes aos herbicidas obtidas por mutagénese, bem como, por outro, que ordenasse ao Primeiro‑Ministro, sob cominação de uma sanção pecuniária compulsória, que tomasse todas as medidas necessárias para instaurar uma moratória para as variedades de plantas resistentes aos herbicidas, obtidas por mutagénese.

12      Por Decisão de 3 de outubro de 2016, o Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) submeteu ao Tribunal de Justiça um pedido de decisão prejudicial, que deu origem ao Acórdão de 25 de julho de 2018, Confédération paysanne e o. (C‑528/16, EU:C:2018:583).

13      Na sequência desse acórdão, o órgão jurisdicional de reenvio, por Decisão de 7 de fevereiro de 2020 (a seguir «Decisão de 7 de fevereiro de 2020»), anulou a decisão tácita referida no n.o 11 do presente acórdão e ordenou ao Primeiro‑Ministro, entre outros, que fixasse, no prazo de seis meses após a notificação dessa decisão, a lista exaustiva das técnicas/métodos de mutagénese que têm sido convencionalmente utilizadas num certo número de aplicações e têm um índice de segurança longamente comprovado.

14      Na Decisão de 7 de fevereiro de 2020, este órgão jurisdicional considerou que resulta do Acórdão de 25 de julho de 2018, Confédération paysanne e o. (C‑528/16, EU:C:2018:583), que devem ser incluídos no âmbito de aplicação da Diretiva 2001/18 os organismos obtidos através de técnicas/métodos que surgiram ou foram principalmente desenvolvidas posteriormente à data de adoção desta diretiva. A este respeito, o referido órgão jurisdicional considerou que tanto as técnicas/métodos ditos «dirigidas» ou «de edição do genoma» como as técnicas de «mutagénese aleatória in vitro» surgiram posteriormente ou se desenvolveram principalmente posteriormente a essa data e que, portanto, se deve considerar que essas técnicas/métodos estão sujeitas às obrigações impostas pela referida diretiva.

15      Com vista a executar a intimação decretada pelo mesmo órgão jurisdicional, o Governo francês elaborou, nomeadamente, um projeto de decreto relativo à alteração da lista das técnicas de obtenção de OGM que têm sido convencionalmente utilizadas sem inconvenientes demonstrados para a saúde pública ou o ambiente, na aceção do artigo L. 531‑2 do Código do Ambiente. Este projeto de decreto previa que a mutagénese aleatória, à exceção da mutagénese aleatória in vitro, devia ser considerada abrangida por essa utilização.

16      Na sequência da notificação do referido projeto de decreto, em aplicação da Diretiva (UE) 2015/1535 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de setembro de 2015, relativa a um procedimento de informação no domínio das regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade da informação (JO 2015, L 241, p. 1), a Comissão Europeia emitiu um parecer circunstanciado. Nesse parecer, indicou, especialmente, que não se justificava, à luz do direito da União e tendo em conta os avanços científicos, efetuar uma distinção entre a mutagénese aleatória in vivo e a mutagénese aleatória in vitro.

17      Não tendo o mesmo projeto de decreto sido adotado pelas autoridades francesas no prazo fixado pela Decisão de 7 de fevereiro de 2020, os recorrentes no processo principal pediram ao Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional), por Petição de 12 de outubro de 2020, que garantisse a execução dessa decisão.

18      O órgão jurisdicional de reenvio salienta que resulta de um parecer emitido pelo Conselho Superior da Biotecnologia que os mecanismos de reparação do ácido desoxirribonucleico (ADN) ativados por alterações induzidas por um agente mutagénico são idênticos, quer as células sejam cultivadas in vitro ou in vivo. Todavia, a cultura in vitro implica variações genéticas e epigenéticas, designadas sob o nome de «variações somaclonais», cuja frequência é superior à das mutações espontâneas.

19      Neste contexto, este órgão jurisdicional considera que, para determinar que técnicas de mutagénese constituem técnicas/métodos que têm sido convencionalmente utilizadas num certo número de aplicações e têm um índice de segurança longamente comprovado, que escapam ao regime de controlo previsto na Diretiva 2001/18, se opõem duas abordagens. Segundo uma primeira abordagem, para este efeito, há apenas que ter em conta o processo pelo qual o material genético é modificado. De acordo com uma segunda abordagem, há que ter em conta todos os impactos no organismo do processo utilizado desde que sejam suscetíveis de afetar a saúde humana ou o ambiente, incluindo os impactos suscetíveis de produzir variações somaclonais.

20      Além disso, este órgão jurisdicional considera que, se for acolhida esta segunda abordagem, é necessário determinar os elementos com pertinência para avaliar se o índice de segurança de uma técnica/método está longamente comprovado. Com efeito, tendo em conta as utilizações da mutagénese aleatória in vitro anteriores à adoção da Diretiva 2001/18, é necessário determinar se há, a este respeito, que dispor de dados suficientes relativos às culturas em campo aberto de organismos obtidos através dessa técnica/método ou se, pelo contrário, essa segurança também pode ser demonstrada com base em trabalhos e publicações de investigações não relacionados com essas culturas.

21      Nestas condições, o Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      O artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva [2001/18], lido em conjugação com o ponto 1 do anexo I B desta diretiva e à luz do seu considerando 17, deve ser interpretado no sentido de que, para se distinguir entre técnicas/métodos mutagénicos que têm sido convencionalmente utilizad[a]s num certo número de aplicações e têm um índice de segurança longamente comprovado, na aceção do Acórdão [de 25 de julho de 2018, Confédération paysanne e o.(C‑528/16, EU:C:2018:583)], devem ser consideradas apenas as modalidades segundo as quais o agente mutagénico modifica o material genético do organismo ou há que ter em conta todas as variações do organismo induzidas pelo processo utilizado, incluindo as variações somaclonais, suscetíveis de afetar a saúde humana e o ambiente?

2)      O artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18/CE, de 12 de março de 2001, lido em conjugação com o ponto 1 do anexo I B desta diretiva e à luz do seu considerando 17, deve ser interpretado no sentido de que, para se determinar se uma técnica/um método de mutagénese têm sido convencionalmente utilizados num certo número de aplicações e têm um índice de segurança longamente comprovado, na aceção do Acórdão do Tribunal de Justiça [de 25 de julho de 2018, Confédération paysanne e.a. (C‑528/16, EU:C:2018:583)] apenas se deve ter em conta as culturas [em] campo aberto dos organismos obtidos através desse método/dessa técnica ou também é possível ter em conta trabalhos e publicações de investigações não relacionadas com essas culturas, e, no caso desses trabalhos e publicações, apenas devem ser considerados os que abordam os riscos para a saúde humana ou para o ambiente?»

 Quanto à tramitação do processo no Tribunal de Justiça

22      O órgão jurisdicional de reenvio pediu ao Tribunal de Justiça que o presente reenvio prejudicial fosse submetido a tramitação acelerada ao abrigo do artigo 105.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.

23      Em apoio deste pedido, este órgão jurisdicional alega que deve, em aplicação das regras processuais francesas, julgar o processo principal com urgência, que este processo põe em causa riscos particulares para a saúde humana e para o ambiente e que suscita uma controvérsia que envolve a Comissão e um número significativo de Estados‑Membros.

24      O artigo 105.o, n.o 1, do Regulamento de Processo prevê que, a pedido do órgão jurisdicional de reenvio ou, a título excecional, oficiosamente, o presidente do Tribunal pode, quando a natureza do processo exija o seu tratamento dentro de prazos curtos, ouvidos o juiz‑relator e o advogado‑geral, decidir submeter um reenvio prejudicial a tramitação acelerada, em derrogação das disposições deste regulamento.

25      No caso em apreço, o presidente do Tribunal de Justiça decidiu, em 10 de dezembro de 2021, ouvidos o juiz‑relator e o advogado‑geral, que não havia que deferir o pedido referido no n.o 22 do presente acórdão.

26      Com efeito, importa, em primeiro lugar, sublinhar que a exigência de tratamento de um litígio pendente no Tribunal de Justiça dentro de prazos curtos não pode decorrer do simples facto de o pedido de decisão prejudicial ter sido apresentado no âmbito de um processo que tem, no sistema nacional, caráter urgente e de o órgão jurisdicional de reenvio ser obrigado a assegurar uma resolução rápida do litígio (Despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 7 de outubro de 2013, Rabal Cañas, C‑392/13, não publicado, EU:C:2013:877, n.o 15 e jurisprudência referida).

27      Em segundo lugar, embora a aplicação da tramitação acelerada possa ser justificada quando exista um forte risco de ocorrência de consequências irremediáveis para o ambiente enquanto se aguarda a decisão do Tribunal de Justiça (v., neste sentido, Despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 13 de abril de 2016, Pesce e o., C‑78/16 e C‑79/16, não publicado, EU:C:2016:251, n.o 10), não resulta da decisão de reenvio que esse risco esteja caracterizado no processo principal, que está pendente desde 2015 e no qual o órgão jurisdicional de reenvio deve pronunciar‑se sobre uma eventual revisão de uma regulamentação nacional que está em vigor há vários anos.

28      Em terceiro lugar, quanto à circunstância de este processo ter suscitado uma controvérsia envolvendo a Comissão e um número significativo de Estados‑Membros, importa recordar que, embora não exista, em princípio, correlação entre o grau de dificuldade de um processo e a urgência que haveria em julgá‑lo, o facto de um processo colocar, como no caso em apreço, problemas jurídicos sensíveis e complexos é suscetível de obstar à aplicação da tramitação acelerada (v., neste sentido, Acórdão de 29 de março de 2022, Getin Noble Bank, C‑132/20, EU:C:2022:235, n.o 53 e jurisprudência referida).

 Quanto à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial

29      A Fédération française des producteurs d’oleagineux et de proteagineux sustenta que não é necessária uma resposta do Tribunal de Justiça ao pedido de decisão prejudicial para decidir o litígio no processo principal e que este pedido é, por conseguinte, inadmissível.

30      Por um lado, o órgão jurisdicional de reenvio já dispõe, com base no Acórdão de 25 de julho de 2018, Confédération paysanne e o. (C‑528/16, EU:C:2018:583), e do processo nacional, de elementos suficientes para decidir o litígio no processo principal, declarando que, uma vez que a mutagénese aleatória in vitro tem sido convencionalmente utilizada num certo número de aplicações e tem um índice de segurança longamente comprovado, esta técnica não é abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2001/18.

31      Por outro lado, este órgão jurisdicional não pode razoavelmente ter dúvidas quanto ao mérito desta apreciação, na medida em que resulta do parecer circunstanciado adotado pela Comissão, referido no n.o 16 do presente acórdão, que a Decisão de 7 de fevereiro de 2020, cuja execução está em causa no processo principal, é contrária ao direito da União na parte em que distingue os regimes respetivos da mutagénese aleatória in vivo e da mutagénese aleatória in vitro.

32      A este respeito, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, no âmbito da cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais instituída pelo artigo 267.o TFUE, o juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão judicial a tomar, tem competência exclusiva para apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal. Consequentemente, desde que as questões submetidas tenham por objeto a interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se (Acórdão de 15 de julho de 2021, The Department for Communities in Northern Ireland, C‑709/20, EU:C:2021:602, n.o 54 e jurisprudência referida).

33      O Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar‑se sobre uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional se for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (Acórdão de 15 de julho de 2021, The Department for Communities in Northern Ireland, C‑709/20, EU:C:2021:602, n.o 55 e jurisprudência referida).

34      No caso em apreço, as questões submetidas visam obter, do Tribunal de Justiça, precisões que permitam ao Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) determinar se, à luz dos elementos por ele constatados em relação às características e utilizações da mutagénese aleatória in vitro e dos elementos que resultam do parecer circunstanciado da Comissão mencionado no n.o 16 do presente acórdão, há que considerar que esta técnica/método é abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2001/18. Por conseguinte, o mérito do argumento, apresentado pela Fédération française des producteurs d’oléagineux et de protéagineux, segundo o qual estes elementos são suficientes para decidir que não é esse o caso depende da resposta a dar a essas questões, não podendo esse argumento, em todo o caso, permitir considerar inadmissíveis as referidas questões.

35      Por outro lado, mesmo admitindo que, como refere a Fédération française des producteurs d’oléagineux et de protéagineux, a solução do litígio no processo principal pode ser deduzida do Acórdão de 25 de julho de 2018, Confédération paysanne e o. (C‑528/16, EU:C:2018:583), e que não há lugar a nenhuma dúvida razoável, essas circunstâncias não são suscetíveis de demonstrar a inadmissibilidade do pedido de decisão prejudicial. As referidas circunstâncias são, quando muito, suscetíveis de isentar o órgão jurisdicional de reenvio da obrigação de reenvio que lhe incumbe por força do artigo 267.o, terceiro parágrafo, TFUE.

36      Com efeito, por um lado, mesmo perante uma jurisprudência do Tribunal de Justiça que resolve a questão de direito em causa, os órgãos jurisdicionais nacionais conservam a mais ampla faculdade para recorrer ao Tribunal de Justiça se o considerarem oportuno, sem que a circunstância de as disposições cuja interpretação é solicitada já terem sido interpretadas pelo Tribunal de Justiça tenha por efeito obstar a que o Tribunal de Justiça se pronuncie novamente (v., neste sentido, Acórdãos de 27 de março de 1963, Da Costa e o., 28/62 à 30/62, EU:C:1963:6, n.os 75 e 76; de 6 de outubro de 1982, Cilfit e o., 283/81, EU:C:1982:335, n.os 13 e 15, e de 6 de outubro de 2021, Consorzio Italian Management e Catania Multiservizi, C‑561/19, EU:C:2021:799, n.os 36 e 37). Por outro lado, não é de modo nenhum proibido a um órgão jurisdicional nacional submeter ao Tribunal de Justiça questões prejudiciais cuja resposta, segundo a opinião de uma das partes no processo principal, não suscita nenhuma dúvida razoável (v., neste sentido, Acórdãos de 1 de dezembro de 2011, Painer, C‑145/10, EU:C:2011:798, n.os 64 e 65, e de 24 de fevereiro de 2022, Viva Telecom Bulgaria, C‑257/20, EU:C:2022:125, n.o 42).

37      Tendo em conta o que precede, há que declarar o pedido de decisão prejudicial admissível.

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

38      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I B, ponto 1, desta diretiva e à luz do seu considerando 17, deve ser interpretado no sentido de que os organismos obtidos através da aplicação de uma técnica/método de mutagénese que se baseia nas mesmas modalidades de modificação, pelo agente mutagénico, do material genético do organismo em causa que uma técnica/método de mutagénese que tem sido convencionalmente utilizada num certo número de aplicações e tem um índice de segurança longamente comprovado, mas que se distingue desta segunda técnica/método de mutagénese por outras características, incluindo a utilização de culturas in vitro, estão excluídos da isenção prevista nesta disposição.

39      Em conformidade com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18 deve ser interpretado tendo em conta não só os seus termos mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que faz parte (v., neste sentido, Acórdão de 25 de julho de 2018, Confédération paysanne e o., C‑528/16, EU:C:2018:583, n.o 42).

40      Embora resulte do artigo 2.o, ponto 2, da Diretiva 2001/18 que os organismos obtidos por meio de técnicas/métodos de mutagénese constituem OGM na aceção desta diretiva, sujeitos às obrigações previstas nesta última (v., neste sentido, Acórdão de 25 de julho de 2018, Confédération paysanne e o., C‑528/16, EU:C:2018:583, n.o 38), decorre do artigo 3.o, n.o 1, da referida diretiva, relativo às isenções, que esta não é aplicável aos organismos obtidos através das técnicas de modificação genética enumeradas no anexo I B desta mesma diretiva.

41      Este anexo I B determina que ficam excluídos do âmbito da referida diretiva os organismos resultantes de técnicas/métodos de modificação genética, desde que estas não envolvam a utilização de moléculas recombinantes de ácidos nucleicos ou de organismos geneticamente modificados diferentes dos obtidos por uma ou mais das técnicas/métodos enumeradas no referido anexo. Entre essas técnicas/métodos, o ponto 1 do mesmo anexo menciona a mutagénese.

42      Nestas condições, a redação do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I B, ponto 1, da mesma, não fornece, por si só, uma indicação determinante quanto aos organismos que o legislador da União Europeia pretendeu excluir do âmbito de aplicação desta diretiva.

43      Dito isto, o considerando 17 da Diretiva 2001/18 clarifica os critérios pertinentes para considerar que um organismo não está sujeito às obrigações previstas nesta diretiva, ao enunciar que esta não deve ser aplicável aos organismos obtidos por meio de certas técnicas de modificação genética que tenham sido convencionalmente utilizadas num certo número de aplicações e têm um índice de segurança longamente comprovado (v., neste sentido, Acórdão de 25 de julho de 2018, Confédération paysanne e o., C‑528/16, EU:C:2018:583, n.os 44 a 46).

44      Além disso, a interpretação do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I B, ponto 1, da mesma, deve ser efetuada tendo em conta o objetivo desta diretiva, como resulta do seu artigo 1.o, a saber, em conformidade com o princípio da precaução, proteger a saúde humana e o ambiente, por um lado, quando são efetuadas libertações no ambiente deliberadas de OGM para qualquer fim diferente da colocação no mercado, no território da União e, por outro, quando são colocados no mercado, no território da União, produtos que contenham ou sejam constituídos por OGM (v., neste sentido, Acórdão de 25 de julho de 2018, Confédération paysanne e o., C‑528/16, EU:C:2018:583, n.o 52).

45      Ora, uma interpretação do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I B, ponto 1, da mesma, segundo a qual estão excluídos do âmbito de aplicação desta diretiva os organismos obtidos por meio de técnicas/métodos de mutagénese, sem distinção, comprometeria o objetivo de proteção da saúde humana e do ambiente prosseguido pela referida diretiva e violaria o princípio da precaução que esta pretende aplicar (v., neste sentido, Acórdão de 25 de julho de 2018, Confédération paysanne e o., C‑528/16, EU:C:2018:583, n.o 53).

46      À luz, nomeadamente, dos elementos que antecedem, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I B, ponto 1, desta diretiva e à luz do seu considerando 17, deve ser interpretado no sentido de que só estão excluídos do âmbito de aplicação da referida diretiva os organismos obtidos por meio de técnicas/métodos de mutagénese que têm sido convencionalmente utilizadas num certo número de aplicações e têm um índice de segurança longamente comprovado (v., neste sentido, Acórdão de 25 de julho de 2018, Confédération paysanne e o., C‑528/16, EU:C:2018:583, n.o 54).

47      A este respeito, importa sublinhar que a limitação do alcance da isenção prevista no artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I B, ponto 1, da mesma, por referência ao duplo critério da utilização convencional num certo número de aplicações e do índice de segurança longamente comprovado, está estreitamente ligada ao próprio objetivo desta diretiva, exposto no n.o 44 do presente acórdão.

48      A aplicação deste duplo critério permite, assim, garantir que, em razão da antiguidade e da variedade das utilizações de uma técnica/método de mutagénese e das informações disponíveis quanto à sua segurança, os organismos obtidos através dessa técnica/método podem ser libertados no ambiente ou colocados no mercado da União, sem que se afigure indispensável, a fim de evitar a ocorrência de efeitos negativos para a saúde humana e o ambiente, submeter esses organismos aos procedimentos de avaliação dos riscos referidos, respetivamente, na parte B e na parte C da Diretiva 2001/18.

49      Esta aplicação responde igualmente à exigência de interpretação estrita do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I B, n.o 1, da mesma, decorrendo da natureza derrogatória desta disposição da exigência de submeter os OGM às obrigações previstas nesta diretiva (v., neste sentido, Acórdão de 25 de julho de 2018, Confédération paysanne e o., C‑528/16, EU:C:2018:583, n.o 41).

50      No caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio pretende, em substância, saber se, a fim de determinar se uma técnica/método de mutagénese deve ser equiparada a uma técnica/método de mutagénese que obedece ao duplo critério da utilização convencional e do índice de segurança comprovado, basta examinar as modalidades de modificação, pelo agente mutagénico, do material genético do organismo em causa.

51      A este respeito, há que constatar que uma extensão geral do benefício da isenção prevista no artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18 aos organismos obtidos através da aplicação de uma técnica/método de mutagénese que se baseia nas mesmas modalidades de modificação, pelo agente mutagénico, do material genético do organismo em causa que uma técnica/método de mutagénese convencionalmente utilizada num certo número de aplicações e que tem um índice de segurança longamente comprovado, mas que combina estas modalidades com outras características, distintas das desta segunda técnica/método de mutagénese, não respeitaria a intenção do legislador da União exposta no n.o 48 do presente acórdão.

52      Com efeito, não se pode excluir que a aplicação de uma técnica/método que apresente essas características conduza a modificações genéticas do organismo em causa que diferem, pela sua natureza ou pelo ritmo a que ocorrem, das obtidas através da aplicação da referida segunda técnica/método de mutagénese.

53      Daqui resulta que a limitação do exame levado a cabo para efeitos da aplicação da isenção prevista no artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I B, ponto 1, da mesma, apenas às modalidades de modificação, pelo agente mutagénico, do material genético do organismo em causa apresentaria o risco de, a coberto da aplicação de uma técnica/método de mutagénese que tem sido convencionalmente utilizada e tem um índice de segurança longamente comprovado, serem, definitivamente, obtidos organismos cujo material genético seja diferente daqueles obtidos através da aplicação dessa técnica/método de mutagénese, quando é precisamente a experiência adquirida no que respeita a estes últimos organismos que permite demonstrar que o duplo critério resultante desta disposição está satisfeito.

54      Por conseguinte, a libertação no ambiente ou a colocação no mercado, sem condução de um procedimento de avaliação dos riscos, de organismos obtidos por meio de uma técnica/método de mutagénese que apresenta características distintas das de uma técnica/método de mutagénese que tem sido convencionalmente utilizada num certo número de aplicações e tem um índice de segurança longamente comprovado é suscetível, em certos casos, de implicar efeitos negativos, eventualmente irreversíveis e que podem afetar vários Estados‑Membros, para a saúde humana e o ambiente, mesmo quando essas características não digam respeito às modalidades de modificação, pelo agente mutagénico, do material genético do organismo em causa.

55      Ainda assim, considerar que os organismos obtidos através da aplicação de uma técnica/método de mutagénese que tem sido convencionalmente utilizada num certo número de aplicações e tem um índice de segurança comprovado estão necessariamente abrangidos pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2001/18 quando essa técnica/método sofreu uma qualquer modificação seria suscetível de privar amplamente de efeito útil a isenção prevista no artigo 3.o, n.o 1, desta diretiva, lido em conjugação com o anexo I B, ponto 1, da mesma, uma vez que essa interpretação poderia tornar excecionalmente difícil qualquer forma de adaptação das técnicas/métodos de mutagénese, quando essa interpretação não é necessária à realização do objetivo de proteção do ambiente e da saúde humana prosseguido pela referida diretiva, em conformidade com o princípio da precaução.

56      Por conseguinte, há que considerar que a circunstância de uma técnica/método de mutagénese compreender uma ou várias características distintas das de uma técnica/método de mutagénese que tem sido convencionalmente utilizada num certo número de aplicações e tem um índice de segurança longamente comprovado, só justifica que se afaste a isenção prevista no artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I B, ponto 1, da mesma, desde que se demonstre que essas características são suscetíveis de implicar modificações do material genético do organismo em causa diferentes, pela sua natureza ou pelo ritmo a que ocorrem, das que resultam da aplicação desta segunda técnica/método de mutagénese.

57      No entanto, no processo principal, o órgão jurisdicional de reenvio é especificamente chamado a determinar se a aplicação in vitro de uma técnica/método de mutagénese inicialmente utilizada in vivo pode estar abrangida por esta isenção. Importa, assim, verificar se o legislador da União considerou que o facto de uma técnica/método implicar culturas in vitro é decisivo para determinar se essa aplicação é ou não abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2001/18.

58      A este respeito, o legislador da União não considerou que as modificações genéticas inerentes às culturas in vitro, a que o órgão jurisdicional de reenvio se refere, justificavam que os organismos afetados por essas modificações devessem necessariamente ser qualificados de «OGM» sujeitos aos procedimentos de avaliação dos riscos visados, respetivamente, na parte B e na parte C da Diretiva 2001/18.

59      Com efeito, em primeiro lugar, a cultura in vitro não figura na lista exemplificativa das técnicas que, em aplicação do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I A, parte 1, desta, devem ser vistas como produzindo uma modificação genética que permite considerar um organismo como um «OGM», na aceção da referida diretiva.

60      Em segundo lugar, resulta do artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I A, parte 2, da mesma, que a fertilização in vitro não é considerada, para efeitos da aplicação desta diretiva, uma técnica que implica uma modificação genética, salvo quando envolva a utilização de moléculas recombinantes de ácidos nucleicos ou de OGM obtidos por outras técnicas/métodos. Assim, a circunstância de a aplicação desta técnica pressupor uma cultura in vitro não foi, enquanto tal, considerada, pelo legislador da União, como um obstáculo à sua exclusão do âmbito de aplicação desta diretiva.

61      Do mesmo modo, resulta do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I B, ponto 2, da mesma, que a fusão celular de células vegetais de organismos que podem trocar material genético através dos métodos tradicionais de cultura está excluída do âmbito de aplicação desta diretiva quando, como observaram o Governo francês e a Comissão nas suas observações escritas sem serem contraditados, esta fusão celular é necessariamente aplicada in vitro em células isoladas.

62      Em terceiro lugar, decorre do artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I A, parte 2, ponto 3, da mesma, que o legislador da União optou por não fazer depender o regime aplicável à indução da poliploidia do facto de esta última ser ou não aplicada in vitro. Ora, a Comissão sublinhou a este respeito nas suas observações escritas, sem ser contraditada, que a aplicação in vitro desta técnica já era conhecida há muito tempo quando esta diretiva foi adotada.

63      Neste contexto, como alegam, em substância, o Governo francês e a Comissão, considerar que, em razão dos efeitos inerentes às culturas in vitro, um organismo obtido através da aplicação in vitro de uma técnica/método de mutagénese inicialmente utilizada in vivo está excluído da isenção prevista no artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I B, ponto 1, da mesma, ignoraria o facto de o legislador da União não ter considerado que esses efeitos inerentes eram pertinentes para definir o âmbito de aplicação desta diretiva.

64      Tendo em conta o que precede, há que responder à primeira questão que o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I B, ponto 1, desta diretiva e à luz do seu considerando 17, deve ser interpretado no sentido de que os organismos obtidos através da aplicação de uma técnica/método de mutagénese que se baseia nas mesmas modalidades de modificação, pelo agente mutagénico, do material genético do organismo em causa que uma técnica/método de mutagénese que tem sido convencionalmente utilizada num certo número de aplicações e tem um índice de segurança longamente comprovado, mas que se distingue desta segunda técnica/método de mutagénese por outras características, estão, em princípio, excluídos da isenção prevista nesta disposição, desde que se demonstre que essas características são suscetíveis de implicar modificações do material genético desse organismo diferentes, pela sua natureza ou pelo ritmo a que ocorrem, das que resultam da aplicação da referida segunda técnica/método de mutagénese. No entanto, os efeitos inerentes às culturas in vitro não justificam, enquanto tais, que sejam excluídos desta isenção os organismos obtidos através da aplicação in vitro de uma técnica/método de mutagénese que tem sido convencionalmente utilizada num certo número de aplicações in vivo e tem um índice de segurança longamente comprovado à luz dessas aplicações.

 Quanto à segunda questão

65      Resulta da decisão de reenvio que uma resposta à segunda questão é necessária para a resolução do litígio no processo principal apenas no caso de resultar da resposta à primeira questão que, para determinar se uma técnica/método de mutagénese é abrangida pela isenção prevista no artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18, lido em conjugação com o anexo I B, ponto 1, da mesma, há que ter em conta os efeitos inerentes às técnicas/métodos que implicam uma cultura in vitro.

66      Logo, tendo em conta a resposta dada à primeira questão, não há que responder à segunda questão.

 Quanto às despesas

67      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

O artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de março de 2001, relativa à libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente modificados e que revoga a Diretiva 90/220/CEE do Conselho, lido em conjugação com o anexo I B, ponto 1, desta diretiva e à luz do seu considerando 17,

deve ser interpretado no sentido de que:

os organismos obtidos através da aplicação de uma técnica/método de mutagénese que se baseia nas mesmas modalidades de modificação, pelo agente mutagénico, do material genético do organismo em causa que uma técnica/método de mutagénese que tem sido convencionalmente utilizada num certo número de aplicações e tem um índice de segurança longamente comprovado, mas que se distingue desta segunda técnica/método de mutagénese por outras características, estão, em princípio, excluídos da isenção prevista nesta disposição, desde que se demonstre que essas características são suscetíveis de implicar modificações do material genético desse organismo diferentes, pela sua natureza ou pelo ritmo a que ocorrem, das que resultam da aplicação da referida segunda técnica/método de mutagénese. No entanto, os efeitos inerentes às culturas in vitro não justificam, enquanto tais, que sejam excluídos desta isenção os organismos obtidos através da aplicação in vitro de uma técnica/método de mutagénese que tem sido convencionalmente utilizada num certo número de aplicações in vivo e tem um índice de segurança longamente comprovado à luz dessas aplicações.

Assinaturas


*      Língua do processo: francês.